
NeuroArquitetura responsiva à Demência: projetando espaços memoráveis para uma ambiência saudável
Por Ciro Férrer Herbster Albuquerque
A demência é um termo amplo que engloba uma variedade de sintomas decorrentes de distúrbios que afetam o funcionamento do cérebro e prejudicam o processamento da memória, das emoções, do comportamento e do pensamento. Além da Doença de Alzheimer (DA), outras formas de demência incluem a Demência Frontotemporal (DFT), Demência Vascular (DV) e Demência de Corpos de Lewy (DCL) [1,2]. Embora a demência seja frequentemente associada à perda de memória, esta é apenas uma das diversas deficiências cognitivas que uma pessoa com demência pode enfrentar. A demência também pode afetar o humor, a percepção sensorial, a linguagem, a aprendizagem, a resolução de problemas, entre outros aspectos, dependendo do tipo de demência, das áreas específicas do cérebro afetadas e do estágio de progressão da doença [1,2,3]. Portanto, as necessidades de apoio social e ambiental podem variar significativamente de um indivíduo para outro.
A Doença de Alzheimer (DA) é a forma mais predominante de demência, contribuindo com 60 a 70% dos casos [2]. Ela afeta aproximadamente 10% das pessoas com mais de 65 anos e cerca de metade dos idosos com mais de 85 anos 2. De acordo com o 1º Big Data Abraz de 2023, foi registrado um total de cerca de 1,757 milhão de indivíduos afetados por algum tipo de demência, dos quais 55% correspondiam à DA [4]. Além disso, de acordo com o Estudo Longitudinal da Saúde dos Idosos Brasileiros (ELSI-Brasil), estima-se que até 2030 haverá cerca de 2,78 milhões de brasileiros com 60 anos ou mais convivendo com demência, um número que aumentará para mais de 5,5 milhões até 2050 [5]. Isso ressalta ainda mais a necessidade de implementar abordagens não farmacológicas para complementar os tratamentos paliativos já existentes.
Nesse sentido, a arquitetura presente no ambiente construído desempenha um papel substancial na promoção da independência e do bem-estar dessas pessoas. Bem como qualquer indivíduo, a arquitetura é capaz de influenciar o comportamento, as respostas emocionais e a capacidade de realizar atividades básicas da vida diária (AVDs) e atividades instrumentais da vida diária (AIVDs) [6]. Dessa forma, ambientes mal projetados ou que não oferecem apoio adequado podem contribuir para comportamentos indesejados, desorientação espacial, ansiedade e agitação. No entanto, ambientes bem planejados proporcionam oportunidades que permitem ao indivíduo se sentir à vontade, compensando deficiências físicas, sensoriais ou cognitivas e otimizando sua independência [7].
No contexto arquitetônico, a ambiência pode ser definida como a qualidade sensorial e espacial de um ambiente, resultante da interação entre fatores físicos e perceptivos, como forma, função, materiais, iluminação, ventilação e acústica, que impactam a experiência dos usuários. Estudos indicam que esses elementos influenciam diretamente o conforto, o bem-estar e o comportamento no espaço construído, sendo determinantes na criação de ambientes terapêuticos e acessíveis [8,9]. No planejamento residencial para idosos com comprometimento cognitivo, a ambiência deve priorizar a criação de espaços intuitivos, seguros e emocionalmente acolhedores, que promovam orientação espacial, autonomia e qualidade de vida [8,9,10]. Isso envolve a combinação de legibilidade ambiental, estímulos sensoriais equilibrados, conectividade social e flexibilidade para adaptação às necessidades progressivas, fatores que podem auxiliar na manutenção da memória, na redução da ansiedade e no suporte às capacidades cognitivas remanescentes [8,9,10].
A experiência da demência e os desafios cognitivos associados variam de pessoa para pessoa, o que implica que as necessidades de suporte cognitivo ou ambiental também são variáveis. Portanto, é crucial que a arquitetura seja capaz de acomodar e atender às necessidades específicas de cada indivíduo. A interconexão entre a arquitetura e a neurociência oferece uma base sólida para diversas linhas de pesquisa nas quais os investigadores se engajam com o propósito de elucidar elementos e aspectos substanciais relacionados ao tema [11,12]. Nesse contexto, a arquitetura incorpora o conhecimento derivado da neurociência para desenvolver projetos que atendam aos princípios fundamentais do bem-estar sustentável associado ao envelhecimento humano, compondo uma ambiência capaz de propiciar a qualidade de vida da pessoa idosa com demência e de ofertar suporte eficaz à sua rede de cuidados multidisciplinar.
Ver Figura 1 – Residente com demência preparando seu próprio café na Casa de Cuidados Meadway Court, Reino Unido. Fonte: boroughcare.org.uk (2021).
OS CAMINHOS DA NEUROARQUITETURA EM PROL DA VITALIDADE DO IDOSO COM DEMÊNCIA
Conforme Juhani Pallasmaa (2013), a arquitetura desempenha um papel fundamental na manifestação e realização das necessidades cognitivas do ser humano, particularmente relevante para pacientes com distúrbios neurológicos como a Doença de Alzheimer (DA), que frequentemente enfrentam dificuldades para adaptar seu ambiente às suas necessidades específicas [12]. Portanto, arquitetos, em colaboração com equipes multidisciplinares de cuidados à demência, devem identificar essas necessidades e projetar espaços que atendam eficazmente aos usuários, aprimorando assim sua qualidade de vida.
A integração da arquitetura com a neurociência, conhecida como NeuroArquitetura, oferece uma perspectiva inovadora sobre como o ambiente construído pode influenciar a atividade cerebral e, consequentemente, o comportamento humano [13,14,15]. Pesquisas em neurociência demonstram a profunda ligação entre o cérebro humano e seu ambiente, destacando como estímulos ambientais podem impactar diretamente a estrutura cerebral, conferindo ao espaço projetado o potencial de influenciar o comportamento humano e estimular as funções cognitivas [16.17].
Nesse contexto, o design de ambientes residenciais desempenha um papel crucial na melhoria da qualidade de vida de idosos com DA. Uma análise detalhada dos estudos e evidências provenientes da neurociência relacionados a pacientes com distúrbios neurológicos é fundamental para compreender como os espaços residenciais podem ser projetados e avaliados de maneira mais adequada para atender às necessidades específicas desses pacientes [18]. Por exemplo, um jardim terapêutico deve cumprir diversos critérios, incluindo acessibilidade, conforto, estímulo positivo, áreas de descanso e reflexão, espaços para exercícios e fisioterapia, e consideração dos diferentes estágios da DA [19,20].
Antes de realizar adaptações em residências de pessoas com demência, é crucial realizar uma avaliação de suas necessidades, geralmente conduzida por profissionais de saúde ou serviços sociais. Essa avaliação leva em consideração as condições individuais do paciente, suas necessidades cognitivas e motoras, garantindo adaptações personalizadas que atendam às necessidades únicas de cada pessoa.
As repercussões neurofisiológicas da demência englobam déficits sensoriais, cognitivos e físicos, incluindo diminuição na percepção e interpretação de estímulos sensoriais, perda de memória, desorientação, problemas de mobilidade e visuais [19, 20]. Essas dificuldades podem resultar em situações de risco, confusão e dependência, requerendo supervisão contínua à medida que a doença progride. A demência de Corpos de Lewy (LBD), por exemplo, apresenta desafios adicionais, como alucinações visuais e dificuldades de equilíbrio e percepção de distâncias, que progridem rapidamente. A hipótese da docilidade ambiental (HDA) é utilizada como a, sugerida por Lawton e Simon em “The ecology of social relationships in housing for the elderly”, argumenta que pessoas com restrições de saúde ou capacidade cognitiva tornam-se mais dependentes de seu ambiente, pois têm mais dificuldade em adaptar o espaço às suas necessidades [21]. Marquardt e Schmieg, no estudo “Dementia-friendly architecture: Environments that facilitate wayfinding in nursing homes”, evidenciaram que “isso implica que pessoas com demência têm uma capacidade reduzida de regular os fatores ambientais, portanto, seu ambiente deve ser projetado de forma a atender às suas necessidades específicas” (p. 333) [22].
Portanto, a criação de ambientes sensíveis à demência, dentro do conceito de aging-in-place — que se refere à capacidade de envelhecer no próprio lar ou comunidade, com a manutenção da maior independência possível e sem a necessidade de mudanças para instituições de longa permanência — envolve considerações de design que abordam de maneira discreta os riscos potenciais, incorporando características que favorecem a segurança, a acessibilidade e a autonomia. Essa abordagem permite que pessoas com demência permaneçam em seus ambientes familiares por mais tempo, promovendo o envelhecimento saudável ao garantir que o espaço seja adaptado às suas necessidades específicas, minimizando riscos, estimulando a memória e o bem-estar emocional.
Controle dos estímulos ambientais
A demência pode afetar a capacidade de processar estímulos sensoriais, resultando em desafios para lidar com diferentes tipos de estímulos provenientes do ambiente, como a iluminação, as superfícies dos objetos, o controle sonoro, a temperatura, a qualidade do ar e a tonalidade das cores no ambiente construído. No entanto, é importante evitar tanto a sobrecarga sensorial quanto a falta de estímulos sensoriais, que são comuns em indivíduos com demência. O excesso de estímulos pode causar distração, agitação e estresse, enquanto a falta de estímulos pode levar à apatia, confusão e dificuldades na comunicação [23,24]. Portanto, ao criar ambientes adequados para pessoas com demência, é essencial considerar estratégias de estimulação sensorial apropriadas, adaptadas aos diferentes estágios da doença, visando melhorar o bem-estar e a qualidade de vida dessas pessoas.
Cuidados com a Iluminação
A iluminação desempenha um papel essencial no design de edifícios, e sua importância é ainda mais evidente quando se considera a população idosa e pessoas com demência ou deficiências visuais. A qualidade do ambiente visual é diretamente afetada pelo design de iluminação, que pode desempenhar um papel crucial na definição da função do espaço. No entanto, indivíduos com demência frequentemente enfrentam a redução da exposição à luz natural, o que pode perturbar seus ritmos circadianos e levar a distúrbios do sono, como insônia, agitação noturna e sonolência diurna.
O envelhecimento, por sua vez, resulta em deterioração da visão, incluindo diminuição da acuidade visual, sensibilidade ao contraste reduzida e dificuldades em lidar com variações de luz. Para atender a esses desafios, ambientes residenciais devem ser projetados de forma a oferecer luz natural, iluminação adequada e uniforme, minimizar o brilho, evitar áreas escuras e considerar as diferentes capacidades visuais das pessoas com demência em estágios variados, bem como os diferentes tipos de distúrbios do sono que podem surgir [23, 24].
Atenção aos deslocamentos
A transição de indivíduos com demência de suas residências para Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) ou instalações hospitalares é um processo complexo, frequentemente associado a inúmeras dificuldades. Durante essa mudança, esses indivíduos enfrentam desafios relacionados à adaptação ao novo ambiente, à aceitação de novos papéis, à perda de identidade pessoal e social, bem como à gestão de questões de controle e privacidade em um contexto diferente [23, 24, 25].
Além disso, a compreensão de ambientes desconhecidos e da terminologia especializada associada pode representar um desafio adicional. Essa transição muitas vezes desencadeia sintomas comportamentais e psicológicos, como agressão, agitação, psicose, delírios, alucinações, ansiedade, apatia e depressão. É importante ressaltar que a falta de apoio adequado durante essa fase de adaptação pode aumentar o risco de institucionalização e mortalidade após a internação hospitalar [23, 24, 25]. Além disso, questões relacionadas à mobilidade e interação social também podem surgir nesse contexto.
Caminhabilidade espacial
Pessoas vivendo com demência, quando inseridas em ambientes desconhecidos, como alas hospitalares, centros de dia e Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs), frequentemente enfrentam sentimentos de ansiedade, confusão e desorientação. A dificuldade de orientação espacial e temporal pode resultar em comportamentos como caminhadas sem propósito e tentativas de sair do loca. No inverno, é comum que a ausência de luz solar e os dias mais curtos intensifiquem a confusão temporal, agravando a desorientação espacial, já que os idosos podem não perceber a mudança de horários ou entender que é noite. Além disso, o frio pode gerar um aumento na sensação de desconforto e ansiedade, levando os indivíduos a realizar comportamentos como levantar-se no meio da noite, acreditando que é hora de se preparar para o dia seguinte [23, 24, 25].
As estratégias de design devem considerar a natureza progressiva da demência, reconhecendo que diferentes tipos de demência afetam a orientação de maneiras distintas. Com o avanço da condição, as pessoas podem se tornar incapazes de reconhecer o ambiente ao seu redor e, em estágios mais avançados, podem até não reconhecer a própria imagem no espelho. Assim, ambientes de saúde e cuidados sociais amigáveis à demência devem evitar elementos que possam gerar confusão quanto à função dos espaços, reduzir a desordem visual e incorporar princípios da terapia de reminiscência para apoiar a consciência pessoal dentro do design [23, 25].
Ver Figura 2 – No Abbeyfield Winnersh Assisted Living, situado em Berkshire, Inglaterra, cada um dos 60 residentes possui seu próprio “expositor de memórias” ao lado da porta da entrada – uma espécie de caixa de memórias com itens pessoais, facilmente reconhecíveis, para ajudá-los a identificar sua porta de forma imediata. Fonte: thesocialissue.com (2016).
Esses ambientes devem também incluir sinais claros que ajudem as pessoas com demência a identificar as funções dos espaços, assim como marcos visuais internos e externos que auxiliam na orientação e na identificação de data, hora e localização [23, 25].
Organização espacial simplificada
Ambientes projetados para pessoas com demência devem adotar abordagens que simplifiquem o espaço, minimizando a necessidade de decisões baseadas na memória ou inferências. Isso pode ser alcançado por meio de layouts compactos e diretos, com acessos visuais imediatos a espaços e funções essenciais, facilitando a compreensão do ambiente. Além disso, a proximidade entre espaços relacionados, como cozinha, áreas de lazer e salas de atividades, contribui para uma melhor organização espacial [23, 25].
Ver Figura 3 – Concluída em 2018 pelo escritório Schmid Schaerer, a Memory Care Bombach, localizada na cidade de Zurique, Alemanha, oferece salas de estar destinadas às atividades cognitivas e à interação social entre as pessoas idosas com demência. O contato visual com o meio externo observado na figura proporciona aos residentes melhorias na regulação do ritmo circadiano, levando em consideração a possibilidade de percepção da passagem do tempo. Fonte: schmidschaerer.ch (2019).
É igualmente importante fornecer pontos de referência visuais claros que sirvam como âncoras espaciais, integrando forma, função e significado para facilitar a orientação e o reconhecimento. Para isso, deve-se evitar corredores longos, ambientes monótonos e composições arquitetônicas uniformes, os quais podem gerar sensação de repetição. Também é crucial oferecer rotas de circulação bem definidas e minimizar mudanças de direção no sistema de circulação para garantir uma melhor orientação [23, 25].
Sinalização amigável à demência
A sinalização deve utilizar elementos visuais, como pictogramas, nomes dos residentes/pacientes, retratos e etiquetas fotográficas, além de setas próximas ao texto para melhorar a compreensão. Abreviações devem ser evitadas, e marcos visuais com significado especial para os usuários, como imagens representativas da área local, devem ser incorporados como pontos de referência. Recomenda-se o uso de objetos pessoais para identificar espaços privados, como imagens nas portas dos quartos, criando uma conexão afetiva e auxiliando na identificação do ambiente [23, 25].
Ver Figuras 4 e 5 – Sinalização responsiva às necessidades de navegação de pessoas com demência. Devem conter tanto a linguagem verbal como a linguagem não verbal. Recomenda-se também a inclusão de braille e símbolos táteis em placas de sinalização, permitindo que pessoas cegas possam ler e interpretar as informações com o toque. Já os símbolos táteis, como setas ou figuras em relevo, auxiliam na orientação pelo espaço. Fonte: shop.signbox.co.uk (2020).
Conexão com a Natureza
Jardins e ambientes externos devem incluir caminhos bem definidos, livres de obstáculos e pontos de decisão complexos, que orientem as pessoas por pontos de interesse que ofereçam oportunidades de envolvimento em atividades ou interação social. Evidencia-se maior segurança quando são utilizados contrastes apropriados em caminhos, móveis e plantio, tornando o ambiente externo ainda mais acessível [23, 24, 25, 26]. Além disso, apoiar a conexão a experiências familiares com crianças, por exemplo, podem proporcionar estímulos emocionais benéficos e satisfação pessoal. Para isso, sugere-se a presença de um galpão com ferramentas seguras para uso, áreas com mesas e cadeiras para refeições e lanches da tarde com mobiliários inclusivos ou uma área de recreação [23, 24, 25].
Ver Figura 6 – O Memory Care Bombach oferece um amplo jardim terapêutico destinado a encontros sociais, estímulos cognitivos, físicos e sensoriais Fonte: schmidschaerer.ch (2019).
Estudos indicam que atividades horticulturais com acompanhamento profissional são capazes de estimular o senso de cuidado, conectividade com o local e o apaziguamento de estágios emocionais ansiogênicos ou depressivos. Ademais, o acesso visual à natureza e ao ar livre auxilia na manutenção da orientação em relação à hora do dia e às estações do ano, ajudando a compensar a perda de orientação e mitigar a “Síndrome do Entardecer”, também conhecida como Sundown Syndrome[1].
Ver Figura 7 – Jardim Sensorial projetado cuidadosamente localizado na Casa de Cuidados Meadway Court, Reino Unido. Fonte: boroughcare.org.uk (2021).
Aparência residencial
A arquitetura residencial deve permitir que o morador com demência mantenha sua independência por meio do uso de design de edifícios, móveis, acessórios e cores familiares. A estrutura também deve oferecer oportunidades de personalização do ambiente, permitindo o uso de objetos pessoais e familiares. Deve-se priorizar a caminhabilidade e a compreensão de cada cômodo da casa.
Ver Figura 8 – A ambientação dos cômodos privativos de residentes com demência deve incluir elementos capazes de personalizar o espaço. Porta-retratos, livros, quadros, almofadas e roupas de cama contribuem para uma atmosfera mais acolhedora, ajudando a reduzir transtornos de humor e promovendo uma maior sensação de segurança, conforto e pertencimento no ambiente residencial. Fonte: schmidschaerer.ch (2019).
A independência também é apoiada tornando os banheiros facilmente identificáveis e acessíveis, fornecendo iluminação adequada entre a cama e o banheiro em quartos com instalações de suíte. Sugere-se que os quartos devam incluir suítes, projetados para permitir a personalização do espaço privado [23, 25]. Indica-se, também, a existência de um ótimo acesso visual e rotas circulares que incentivam a mobilidade, apoiando assim a sensação de independência.
Ver Figura 9 – O Four Ferns Nursing Home Healthcare, situado próximo a Dublin, Irlanda, oferece quartos personalizados e adaptáveis às necessidades de cada residente. As modificações graduais permitem que a pessoa idosa mantenha um maior protagonismo, preservando sua independência mesmo diante das limitações impostas pelo quadro demencial.
Fonte: fourferns.ie (2022).
PERSPECTIVAS FUTURAS
O presente artigo teve como objetivo demonstrar a relevância da arquitetura residencial como auxílio ao tratamento não farmacológico de residentes diagnosticados com demência, baseando-se nos conhecimentos da neurociência e das contribuições que esses estudos podem oferecer ao espaço construído. O controle dos estímulos ambientais; o cuidado com a iluminação; a atenção aos deslocamentos; a caminhabilidade espacial; a organização simples e objetiva; conexão com a natureza; e a aparência residencial fomentam algumas das contribuições da NeuroArquitetura aplicada à residência do público estudado. Destaca-se, dessa forma, a importância da relação entre estudos sobre o cérebro e projetos arquitetônicos na promoção do bem-estar e da qualidade de vida de indivíduos com quadros neurodegenerativos, como a Doença de Alzheimer, a Doença por Corpos de Lewy, a Demência Vascular e a Demência Frontotemporal.
Os residentes idosos com demência podem apresentar uma ampla diversidade de comportamentos, alguns esperados ao longo do contínuo das demências, enquanto outros podem se manifestar de forma menos previsível. Essa variabilidade reforça a importância de ambientes residenciais adaptáveis, capazes de responder às necessidades individuais de cada pessoa.
Nesse contexto, futuras pesquisas podem aprofundar-se no estudo de projetos baseados em princípios da NeuroArquitetura e na análise das atividades cerebrais e comportamentais de residentes idosos que vivem em Moradia Assistida (Assisted Living Facilities), Moradias com Serviços Qualificados de Enfermagem (Skilled Nursing Facilities) e Moradias de Assistência à Demência (Memory Care). Ressalta-se o objetivo da NeuroArquitetura responsiva à Demência é de compreender como o ambiente construído pode influenciar a saúde e o bem-estar desses indivíduos, promovendo benefícios cognitivos e emocionais ao longo do envelhecimento.
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Artigo de Ciro Férrer Herbster Albuquerque
Arquiteto e Urbanista. Pós-Graduado em Neurociência, Gerontologia e Neuroarquitetura. Mestrando no Programa de Arquitetura, Urbanismo e Design, Linha de Pesquisa de Planejamento Urbano e Direito à Cidade, do PPGAU+D, na Universidade Federal do Ceará (UFC), Fortaleza, Ceará. ORCID: https://orcid.org/0000-0002-7462-6941 . E-mail: ciro.ferrer@hotmail.com.