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ARTIGO DE OPINIÃO
REVISTA: Edifícios e Energia
Ricardo Rosa, arq (Sócio Gerente da kriptonarchitecture)
Soluções Passivas na Reabilitação Urbana
Arrefecer sem custos na Reabilitação de Edifícios
INTRODUÇÃO
Sombreamento, Inércia Térmica, Ventilação Natural e Isolamento Térmico, serão talvez os 4 factores cruciais para arrefecer de uma forma passiva os edifícios que usamos. Arrefecer passivamente um espaço custa 0€ na sua operação, pois para tal acontecer não é necessária uma qualquer fonte de energia, sendo a eléctrica a mais utilizada nos sistemas de arrefecimento activo (“ar-condicionado”).
Naturalmente que haverá sempre custos na aquisição e instalação/aplicação dos materiais necessários ao processo de arrefecimento passivo tal como também acontece nos sistemas de climatização, mas será na operação dos mesmos que o custo se torna mais elevado se optarmos por soluções activas.
À operação dever-se-á adicionar os custos de manutenção, que no caso das soluções passivas será praticamente nulo, contudo nas soluções activas pode tornar-se numa despesa considerável e até, idealmente obrigatória, no caso da limpeza de filtros e condutas, pois caso não seja feita, poderá ainda significar custos perigosos para a saúde das pessoas que usam esses edifícios (os casos de Legionela).
A Reabilitação Urbana (e de edifícios), está na ordem do dia e é uma oportunidade extraordinária para melhorar o conforto e a eficiência energética dos
edifícios, até porque muitos deles (edifícios a reabilitar), contêm à partida 2 dos factores mencionados no início deste artigo, refiro-me à Inércia Térmica e
à Ventilação Natural.
A Inércia Térmica está presente nas paredes estruturais de alguns desses edifícios (constituídas por pedra e tijolo) e a Ventilação Natural está presente nas janelas, pois todas elas se podiam e podem abrir, situação que nalguns casos deixou de acontecer, nomeadamente nalguns edifícios de escritórios.
O Sombreamento perdeu-se nalguns casos, pelo criação de marquizes naquilo que eram varandas e é inexistente numa considerável percentagem de janelas dos edifícios a reabilitar.
O Isolamento Térmico é praticamente inexistente em edifícios anteriores a 1990, ano em que foi implementado em Portugal o primeiro RCCTE (Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios).
INTERDEPENDÊNCIA DOS 4 FACTORES
Sombreamento, Inércia Térmica, Ventilação Natural e Isolamento Térmico, dependem todos uns dos outros para se atingirem os melhores resultados no arrefecimento passivo. No Verão (de uma forma geral) as temperaturas aumentam ao longo da manhã, atingem o seu valor máximo a meio da tarde e voltam a arrefecer no final do dia, sendo a noite o período durante a qual as temperaturas se encontram mais baixas;
O Sombreamento é talvez a medida mais eficaz para evitar que os raios solares atinjam uma superfície. Essencial existir nos vãos envidraçados (janelas), nos quadrantes Sul, Nascente e Poente, para a nossa latitude. Diminui o efeito de estufa, quando a superfície a sombrear é de vidro;
A Inércia Térmica, quando existente nas paredes exteriores, interiores e/ou em lajes, é uma característica física de determinados materiais como a pedra, o tijolo (material cerâmico) e o betão, que permite a esses elementos funcionarem como “depósitos de calor”. Têm a capacidade para “absorver calor” até atingirem o seu limite de acumulação, que pode demorar dias (dependendo da espessura do elemento, parede ou laje) mas de uma forma geral podemos contar com um dia. Trata-se de um factor que retarda a velocidade a que os espaços interiores aquecem. Deste modo aproveita-se o período da noite, quando esses materiais começam a “expelir” o calor retido durante o dia, para juntamente com a Ventilação Natural, “varrermos” o calor para fora do edifício e assim capacitarmos novamente esses materiais para “absorver” o calor do dia seguinte.
Trata-se, por conseguinte, de um factor do qual poderemos tirar partido, se mantivermos as referidas paredes com essas características, algo que nem sempre se está a fazer na reabilitação de edifícios, recorrendo-se muitas vezes à substituição dessas paredes maciças por paredes em gesso cartonado.
O gesso cartonado não possui inércia térmica, logo, não tem capacidade para armazenar calor e muitas vezes (nomeadamente em paredes interiores), acaba por funcionar como elemento isolante pois contém também materiais isolantes no seu interior, do tipo lã de rocha, utilizado para garantir o isolamento acústico entre compartimentos. Contudo com a presença destes materiais, também isolamos termicamente os compartimentos interiores e consequentemente aumentamos a velocidade a que os espaços interiores aquecem e com isso aumentamos a necessidades de arrefecimento.
A Ventilação Natural, deve ser utilizada sempre que a temperatura exterior estiver mais baixa que a interior e preferencialmente abaixo da temperatura média do corpo humano. Permite, por um lado, acelerar o processo de arrefecimento dos materiais com inércia térmica e por outro, criar a sensação de maior conforto no ser humano, por acelerar o processo de secagem do suor, nomeadamente em ambientes mais húmidos, como é o caso das localidades próximas do litoral.
A Ventilação Natural necessita de pontos de admissão e extracção do ar, geralmente localizados na envolvente exterior dos edifícios, seja fachadas e/ou coberturas, e os elementos mais simples para garantir esses pontos de entrada e saída de ar, são as janelas com possibilidade de serem abertas.
O Isolamento Térmico, tem um papel fundamental na redução dos ganhos térmicos directos, pela incidência dos raios solares nas superfícies opacas – paredes. Confere melhores resultados quando aplicado pelo exterior deixando a inércia térmica voltada para o interior para permitir que a mesma assuma o papel determinante anteriormente explicado. Deve também ser colocado nas coberturas, quer inclinadas quer planas, pelo facto de estas serem as que tem mais trocas térmicas (e a maior velocidade) com o ambiente que as rodeia. Tem uma enorme importância também na redução das perdas de calor, durante o Inverno, quando pretendemos que todo o calor produzido no interior dos edifícios não fuja para exterior através de paredes e coberturas (a qualidade
dos vidros, nomeadamente o facto de serem duplos, também é factor de Isolamento Térmico).
CONCLUSÃO
Naturalmente que estes conceitos carecem de explicação mais detalhada e a sua implementação tem a sua complexidade mas essa tarefa deve ser gerida e implementada pelos técnicos envolvidos nesta industria, tais como, arquitectos, engenheiros e construtores. Contudo, muito deste saber não é novo e pode ser facilmente compreendido através da Arquitectura Popular Portuguesa. Temos exemplos extraordinários de como a construção do edificado se adaptava à cultura e clima locais, de Norte a Sul do País. Talvez apenas o Isolamento Térmico, seja o factor que menos presença tinha nesse tipo de arquitectura e por essa razão provocava (e ainda provoca) situações de extremo desconforto, nomeadamente durante o Inverno, quando o pouco calor que se produzia no interior dos edifícios se dissipava rapidamente através das coberturas dos edifícios, por ausência total de Isolamento Térmico… mas a Inércia Térmica estava lá e bem presente através dos materiais que constituíam as paredes bem como as suas espessuras consideráveis muitas vezes, também, por motivos estruturais.
A tecnologia evoluiu e conseguimos hoje arrefecer o ar interior dos edifícios com aparelhos de ar-condicionado, de uma forma muito fácil… pois, basta carregar num botão… ou pelo menos é essa a mensagem comercial instalada. Os custos são, no entanto, mais elevados no médio/longo prazo, quando optamos por essa solução de arrefecimento. É preciso ter bem presente que essa tecnologia não está preparada para arrefecer “estufas”, que é aquilo em que muitos edifícios se transformaram e se estão a transformar.