District 2020: a nova cidade inteligente que está a nascer no Dubai

Fechadas as portas da Expo 2020 Dubai, uma nova cidade vai surgir no local que acolheu, durante seis meses, a exposição mundial. O District 2020 é o plano para esta nova smart city, que se apresenta como um oásis de sustentabilidade e tecnologia num deserto onde a preocupação com o impacto dos combustíveis fósseis parece ainda não existir.

Mais de 24 milhões de visitantes de todo o mundo passaram pelo recinto da Expo 2020 Dubai, nos Emirados Árabes Unidos (EAU). Os portões do certame internacional fecharam a 31 de Março, depois de 182 dias de actividades e eventos, nos quais 192 países aproveitaram este palco global para dar a conhecer a sua cultura. O encerrar da exposição não representa, no entanto, o fim do seu legado: no mesmo local, em Jebel Ali, e aproveitando 80% das infraestruturas construídas da Expo 2020, começou já a erguer-se uma nova “cidade”, o District 2020. Esta nova centralidade, que deverá começar a receber residentes em Outubro – um ano depois da abertura da exposição mundial –, é um dos cinco centros urbanos projectados no plano director Dubai 2040 e apresenta-se como uma referência para uma “cidade inteligente e sustentável”. “Vai ser mais um benchmark para o Dubai”, refere Nadimeh Mehra, vice-presidente da Expo 2020 e líder do projecto da nova cidade, durante uma apresentação organizada pela Siemens nos últimos dias do certame internacional.

Trazendo à memória Masdar – a cidade construída de raiz em Abu Dhabi para ser pioneira no uso sustentável de energia –, o District 2020 quer, por sua vez, levar as últimas tendências do urbanismo sustentável e centrado nas pessoas ao território emiradense. A ambição passa por transformar os 430 hectares da exposição numa área urbana de usos mistos na qual “todas as necessidades” dos 145 mil residentes previstos podem ser satisfeitas a uma distância percorrível com modos suaves.

Para isso, estão previstos 45 mil metros quadrados de áreas verdes e parques, cinco quilómetros (km) percursos pedonais e de jogging, dez km de ciclovias e ainda quatro km para circulação de veículos autónomos. A inspiração na “cidade dos 15 minutos”, de Carlos Moreno, marcará um contraste com o modelo de desenvolvimento urbano envolvente, no qual, com excepção da linha de metro, prolongada até Jebel Ali por causa da Expo 2020, a primazia do automóvel particular é evidente, promovida pela dispersão e pela construção massiva de infraestruturas rodoviárias.

No plano, o District 2020 será uma referência para a sustentabilidade, havendo também um foco no bem-estar. “Queremos ser a primeira comunidade [com certificação] WELL”, aponta Nadimeh Mehra. Da Expo, o projecto herda os pavilhões temáticos e também um selo, desta vez, de sustentabilidade na construção, já que todos os edifícios construídos para o evento e que permanecerão no local obtiveram a certificação Gold ou Platinum no sistema LEED (Leadership in Energy and Environmental Design).

No que se refere à estratégia de inovação, a ideia, conta a responsável, é seguir o modelo de hélice quádrupla, integrando o governo, a comunidade académica e de investigação, a indústria e os cidadãos, para “maximizar a colaboração e o valor”. O projecto já conseguiu atrair “empresas inovadoras gigantes”, como a Siemens, a Siemens Energy, a multinacional de logística DP World ou o Terminus Technologies, grupo chinês especializado em inteligência artificial, e está também a levar a cabo o programa de empreendedorismo Scale2Dubai. A iniciativa prevê uma série de condições favoráveis para acolher empresas de inovação mais pequenas que pretendam ganhar escala no Dubai, em áreas como as de smart cities ou de mobilidade inteligente. As primeiras 85 finalistas foram anunciadas no final de Março, não tendo havido nenhuma candidatura portuguesa entre as mais de 600 recebidas.

SIEMENS TORNA IOT MAINSTREAM

Embora sendo uma cidade centrada nas pessoas, o District 2020 pretende tirar proveito das novas tecnologias nesse sentido, em particular depois de a pandemia de Covid-19 ter acelerado a digitalização e trazido novos modelos de trabalho, comunicação e colaboração mais digitais. “O District 2020 vai apoiar as necessidades do futuro do trabalho da sua comunidade através de uma rede de tecnologias de informação e comunicação (TIC) que consiste numa infraestrutura digital resiliente altamente conectada, incluindo uma ampla cobertura de 5G e Wi-Fi”, explica Nadimeh Mehra.

Grande parte dessa infraestrutura foi já concebida para a Expo 2020 e teve a Siemens como um dos principais parceiros. A gigante internacional, cuja divisão Smart Infrastructure foi recentemente reconhecida pela analista Verdantix como líder em plataformas que usam tecnologia Internet of Things (IoT) para edifícios inteligentes, foi a responsável pela infraestrutura digital utilizada durante a exposição mundial e que será outra das heranças da nova cidade. Com base na solução na cloud MindSphere, o District 2020 contará com um sistema operativo aberto IoT que, durante a Expo 2020, recebeu dados recolhidos por cerca de 200 mil sensores em mais de 130 edifícios e mais de 15 mil câmaras de videovigilância, e controlou perto de cinco mil portas de acesso, garantindo, assim, a segurança no recinto. Para o futuro distrito, “o propósito é segurança e protecção, qualidade de vida, sustentabilidade e resiliência”, avança Oliver Kraft, que, enquanto vice-presidente executivo da Expo 2020, lidera os esforços da Siemens no projecto.

Durante o evento internacional, a aplicação, concebida a pensar numa smart city, permitiu mais de 60 casos de uso em diversos domínios, incluindo a gestão de resíduos, a monitorização ambiental, o uso de energia e de água nos edifícios, ou ainda o envolvimento dos visitantes, por exemplo através do acesso à rede de Wi-Fi pública ou usando a “localização como serviço”. Para o projecto, a Siemens tirou partido da experiência desenvolvida pela empresa ao longo dos anos em soluções de gestão inteligente de edifícios, e não só, maximizando a solução através das vantagens de monitorização em tempo real proporcionadas pela IoT.

“Estimamos poupanças de energia e de [emissões] de carbono na ordem dos 20-40%”, aponta Matthias Rebellius, CEO da Siemens Smart Infrastructure. Com a Expo 2020, a solução ganhou escala urbana, resultando num projecto em que a IoT deixa de ser usada no modo piloto e passa a ser mainstream e que será agora uma das pedras basilares do District 2020. Num pequeno-almoço com jornalistas, Matthias Rebellius avançou que a empresa está a negociar com outro país a implementação das tecnologias usadas no Dubai, garantindo que “esta é uma solução para todo o tipo de cidades, escalável”. Por sua vez, Afzal Mohammed, vice-presidente IoT and Technology & Innovation na Siemens EAU, confidenciou a intenção de desenvolver um projecto semelhante em Istambul.

Dando o exemplo e de modo a reforçar o compromisso com a região do Médio Oriente, a Siemens Middle East será uma das primeiras a escolher o District 2020 como localização da sua sede, esperando-se que a mudança aconteça a partir do próximo ano. O edifício que, entre Outubro e Março passados, recebeu a The Blueprint – Siemens Customer Experience Center na Expo 2020 será o escolhido para ser a nova casa da empresa nos EAU.

“Tal como o Parque das Nações, ou a nossa Expo 98, inspirou durante muitos anos aquilo que foi feito noutros países, especialmente no que diz respeito ao desenvolvimento bem-sucedido de infraestruturas sustentáveis e inteligentes que continuariam a ser utilizadas muito depois de a Expo terminar, acredito que o District 2020 também servirá de inspiração a muitas iniciativas de cidades portuguesas”, afirma Fernando Silva, responsável pela Smart Infrastructure da Siemens Portugal. “Independentemente da plataforma tecnológica utilizada (MindSphere ou outra), ao longo dos últimos anos, a Siemens Portugal tem desenvolvido diversos projectos que contribuem para a descarbonização e digitalização das nossas cidades, nas áreas dos edifícios inteligentes, da mobilidade eléctrica, dos sistemas distribuídos de energia e da optimização da rede eléctrica. E assim continuaremos a fazer, contribuindo para criar locais mais aprazíveis para vivermos que utilizem eficientemente os recursos disponíveis.”

 

Artigo de Filipa Cardoso (Directora Smart Cities | Jornalista)  publicado no site Smart Cities

*a jornalista viajou a convite da Siemens Portugal

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