
José Baganha recebe hoje, em Madrid, o prémio Rafael Manzano para aqueles que trabalham a arquitetura segundo processos tradicionais. “Este prémio não tem nada a ver com restauro”.
As construções que levam a assinatura do arquiteto português José Baganha podem parecer, a olho nu, reabilitações, casas antigas recuperadas, mas atrás do beirados, das paredes caiadas ou do mosaico hidráulico que usa está a defesa de uma maneira de fazer lhe valeu o prémio Rafael Manzano 2017 para “obras novas feitas segundo características e processos tradicionais”, como explica o premiado ao DN, a partir de Madrid, onde hoje recebe o galardão. “Este prémio não tem nada a ver com restauro”, realça.
Atribuído desde 2012, foi alargado este ano a Portugal e aos seus arquitetos. José Baganha, eleito “por unanimidade” por um júri internacional. “A sua trajetória profissional mostra uma firme vontade de preservar e dar continuidade às tradições arquitetónicas das regiões em que trabalhou, bem como atualizá-las, procurando sempre adaptá-las às exigências do nosso tempo”, fundamentaram.
“O meu entendimento é que a tradição é transmitida de geração em geração e que o nosso processo se enriquece, não é uma coisa estática. A tradição que não evolui morre. E o que quero dizer é que as minhas propostas refletem isso”, afirma o arquiteto, explicando que incorpora “elementos de uma linguagem mais moderna”: “Pode melhorar condições térmicas, adicionar alguma coisa que permita resistir melhor aos sismos…”
Natural de Coimbra, aluno de Arquitetura da Faculdade de Belas Artes do Porto durante dois anos e depois da mesma licenciatura no ano em que o curso foi integrado pela Universidade Técnica de Lisboa, José Baganha, nascido em 1960, conta que sempre se interessou por essa arquitetura tradicional, mesmo quando o assunto não era tão bem visto, o que o levou a trocar a Invicta pela capital. “Eu fiz parte de uma turma em que se podia questionar, explorar outros autores, ver outras coisas, de forma a que esse percurso fosse cada vez mais enriquecido”. “Podia escolher o caminho por onde todos iam, que não estava errado, mas que para mim não era o adequado, e também era mais desafiante”. As instituições mais rígidas dos que os clientes. Entre esses não encontrou resistência, antes “uma identificação com o lugar onde vivem que não fosse uma subtileza, mas algo autêntico e real”.
O Alentejo tem sido um dos principais territórios onde tem trabalhado. É lá que está a trabalhar um projeto que mistura turismo e trabalho agrícola. Defende: “A era industrial acabou. Não podemos continuar a viver como até hoje, a produzir em série como se produziu até hoje. É preciso olhar para certas coisas que sempre existiram”.
A mesma razão que o leva a olhar com atenção para a arquitetura vernacular do sul do país e que depois foi tema da tese de mestrado que defendeu na Universidade do País Basco. “Tiramos lições que são absolutamente preciosas”, afirma, levando o argumento para os dias de hoje em que se fala de fixar populações. “Uma determinada construção, com determinados materiais, feita por empresas locais”. Outro aspeto que o júri da distinção quis salientar. O trabalho de José Baganha é considerado pelo júri do prémio “um modelo de atenção e respeito pelo contexto, quer este seja mais urbano e clássico ou mais rural e vernáculo”. “Nesse sentido, devem ser destacados os seus estudos sobre a arquitetura tradicional do Alentejo que serviram de base a muitos dos seus projetos construídos nesta região, tão contemporâneos como respeitadores da identidade e cultura locais”, segundo o comunicado oficial, conhecido no dia 26 de outubro.
O prémio Rafael Manzano, no valor de 50 mil euros, é apoiado em Portugal pela Fundação Serra Henriques para a promoção de “acções de carácter cultural, científico e educativo nos domínios da qualidade de vida das pessoas e do ambiente” e faz parte do INTBAU – International Network for Traditional Building, Architecture and Urbanism, de que José Baganha também é membro.
Fonte: DN