Contributos e pareceres técnicos das ordens profissionais devem ser devidamente valorizados, ponderados e considerados pelos Deputados.
- Legislação proposta pelo Governo tem aspetos positivos, mas tem também aspetos que degradam a qualidade da arquitetura e da construção e que podem comprometer a segurança
- Cerca de seis meses volvidos sobre a entrada em vigor da alteração do código dos contratos públicos, que permite a generalização do recurso ao regime de conceção-construção e mereceu as críticas da Ordem dos Arquitetos, houve até agora ZERO procedimentos contratuais adjudicados nesta modalidade em matéria de habitação.
- Legislador deve ouvir e respeitar pareceres técnicos
A Ordem dos Arquitectos (OA) lança um apelo aos deputados para que efetuem uma devida valorização e ponderação dos contributos técnicos que tem produzido como reação ao conjunto de propostas legislativas apresentadas pelo Governo, designadamente os que implicam, diretamente, na qualidade e na segurança de obras públicas e do edificado habitacional. Mais apela que os contributos oferecidos pela Ordem dos Engenheiros sejam, também, devidamente considerados na análise atualmente em curso, chamando a atenção para que as Ordens Profissionais, à luz da legislação em vigor, visam “a defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos e a salvaguarda do interesse público”.
A Ordem dos Arquitectos sublinha que a intenção do Governo em modificar algumas dimensões respeitantes à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo e ordenamento do território, é positiva e, nesse sentido, acolhe muitas das medidas enunciadas e das alterações propostas, tais como:
- a intenção de melhorar e clarificar o regime relacionado com a autorização de utilização, mas também a de procurar uma maior adequação nos prazos por forma a reduzir constrangimentos nas operações urbanísticas;
- a adoção de deferimento tácito em certas situações, de clarificar – e até limitar – os poderes regulamentares ao nível de novas exigências instrutórias;
- a obrigatoriedade de passarem a constar em secção própria do Diário da República os regulamentos municipais em matéria de edificação;
- a promoção da transição digital, seja ao nível do desenvolvimento de uma plataforma digital interoperável de âmbito nacional em matéria de urbanismo, de âmbito nacional;
- e a obrigatoriedade – agora já num prazo razoável e numa perspetiva de implementação faseada – do BIM
“Mas este não é, ainda, um ponto de chegada”, sublinha.
Se tais reformas e simplificações não forem devidamente acauteladas – agora, em fase de avaliação de autorização legislativa – os riscos para a qualidade e segurança de futuras edificações podem ser significativos.
Por esses motivos, a Ordem manifesta oposição frontal à privatização/liberalização proposta no domínio da construção:
É largo o espectro de operações urbanísticas que se anuncia passarem para isenção de controlo administrativo. Se a isso se somar o regime de mera comunicação, a eliminação da autorização de utilização, a eliminação do livro de obra (quando já devia estar implementado o eletrónico!), o direito à informação de quem pretende celebrar um negócio jurídico com segurança e fiabilidade fica irremediavelmente comprometido.
O cumprimento das normas legais e regulamentares em obra, face à heterogeneidade de condicionantes, circunstâncias e agentes envolvidos num processo de edificação é, neste momento, difícil de garantir. As muitas medidas – positivas – que constam da PL 77, por benéficas que sejam, sempre serão insuficientes para fazer face ao atual quadro regulatório – caótico e não poucas vezes conflituante – e para atingir o objetivo que se pretende alcançar.
Desburocratizar, sim, mas acautelando a segurança e a qualidade da arquitetura e da obra:
O setor da construção, concorda-se, é hiper-regulamentado. Há passos positivos que estas propostas de lei dão, mas deve avançar-se, a par da aprovação de muita desta legislação, para a criação de um Código de Edificação que:
- agregue e organize num todo inteligível toda a imensidade de regulamentação dispersa, traduzida atualmente em mais de dois mil diplomas dispersos;
- melhore a segurança e incentive a qualidade;
- incremente a eficiência energética;
- se centre na ponderação do ciclo de vida de um edifício;
- assente numa visão em prol de um território bio diverso, com edifícios de baixo impacto ambiental, autossuficientes, saudáveis e inclusivos, em prol de mais e melhor sustentabilidade
A consistência e coerência não são compatíveis com fenómenos disruptivos que, na aparência, acodem a uma urgência, criando a posteriori outras e piores urgências e novas exigências.A Ordem dos Arquitectos refletiu ainda sobre o regime especial de empreitadas de conceção-construção, que mereceu a sua oposição e que entrou em vigor em 2 de dezembro de 2022, sublinhando uma vez mais que esta não pode ser regra e que também não foi a solução para o problema da Habitação. É que, quase 6 meses volvidos, os dados disponíveis revelam que o número de procedimentos contratuais de conceção-construção adjudicados em matéria de habitação é de ZERO!
A Ordem, que sempre se opôs à utilização deste regime em matéria de habitação, voltou a apresentar as suas críticas, agora já sobre as alterações propostas pelo Governo à Portaria N.º 701-H/2008. É que “passados mais de 50 anos, a proposta de alteração da Portaria omite qualquer referência ao documento de 1972 que lhe serviu de base (…) [mas] a sua substância continua a ser essencialmente a mesma, ignorando que (…) muita coisa se alterou.”
“[A] obra pública tem que ser capaz de dar resposta a um contexto completamente diverso, procurando responder à crise habitacional, à transição climática, à reabilitação e regeneração urbana, às intervenções em espaço público, ou à real implementação da política nacional de arquitetura e paisagem que, desde a sua aprovação em Resolução de Conselho de Ministros n.º 45/2015, de 4 de julho, continua por concretizar.”
Importa reservar o modelo de conceção-construção exclusivamente para casos especiais, designadamente de pré-fabricação ou construção off-site, devido à complexidade técnica do processo construtivo e será necessariamente obrigatório criar condições para um regime colaborativo entre a equipa de projeto e o construtor, após a adjudicação do contrato.
É essencial que os deputados compreendam que ao aprovarem algumas das medidas propostas, tal como estão, pelo Governo, se poderão criar problemas mais densos e complexos do que aqueles que, de imediato, se visam atingir.
A responsabilidade de decisão deve considerar devidamente os contributos técnicos dos especialistas.
Enviam-se, em anexo, os seguintes CONTRIBUTOS DA ORDEM DOS ARQUITECTOS:
- PROPOSTA DE LEI N.º 46/XV/1.ª (GOV) – Aprova o Programa Nacional de Habitação para o período 2022-2026
- PROPOSTA DE LEI N.º 71/XV/1.ª (GOV) –Aprova medidas no âmbito do plano de intervenção “Mais Habitação”
- PROPOSTA DE LEI N.º 77/XV/1.ª (GOV) – Autoriza o Governo a proceder à reforma e simplificação dos licenciamentos no âmbito do urbanismo e ordenamento do território.
- Alteração da Portaria n.º 701-H/2008, de 29 de julho
Contributo-OA_Revisao-da-portaria-701H200829
https://espacodearquitetura.com/wp-content/uploads/2023/05/Contributo-OA_Revisao-da-portaria-701H200829.pdf