
Três Corpetes, Um Avental | Ana Carolina Helena . Arquitecta
Antes das máquinas de lavar aparecerem e se democratizarem, antes de termos praticamente todos água corrente em casa, a roupa era lavada à mão, com água e sabão. Esta tarefa, senão diária, semanal, fazia parte do rol de actividades de todas as donas de casa. Na zona saloia, era também comum tornar-se profissão: para aumentar os magros orçamentos familiares, muitas senhoras lavavam para famílias desafogadas de Lisboa – realidade que ficou imortalizada no célebre filme português de 1938, “Aldeia da Roupa Branca”.
Se nas povoações próximas de linhas de água, bastava abeirar-se do rio, noutros locais foram sendo erigidos espaços destinados a esta tarefa: os lavadouros públicos – largos tanques no interior de um pequeno espaço pavilhonar ou meramente cobertos por um telheiro. Muitas vezes próximos de outros pontos de água, como chafarizes e bebedouros, eram não só palco de uma função muito específica como também um local de reunião e convívio feminino por excelência.
Na década de 50 e 60 do século passado, houve inclusivamente um investimento concelhio para que houvesse proximidade populacional a estes espaços, de modo que estes se multiplicaram por inúmeras localidades mafrenses. Hoje, por se terem tornado redundantes, muitos deles estão entregues à rara visita ou mesmo ao abandono.
Se o valor patrimonial dos mesmos é inegável, por contar uma importante parte da história do município, a sua potencialidade não se extingue no presente e no futuro na possibilidade de se tornarem espaços meramente musealizados, de eventual interesse turístico. A sua localização tantas vezes privilegiada, central nos povoados, coloca-os na posição ideal para tornarem a ser locais de partilha comunitária: pontos de troca de livros, de víveres, quem sabe, espaços expositivos temporários, no Verão…
Artigo de Opinião © Ana Carolina Helena . Arquitecta . Venda do Pinheiro
(Texto escrito de acordo com a antiga ortografia, originalmente publicado na coluna “Arquitectura, Paisagem e Mafra” do jornal local “O Carrilhão” )
Imagem – (Excerto do filme de Chianca Garcia “Aldeia da Roupa Branca”, Cinemateca Portuguesa, 1938, onde se vêem mulheres azafamadas a lavar a roupa num tanque)