
A família de Lucio Costa entregou à Casa da Arquitectura – Centro Português de Arquitectura (CA), o espólio do arquiteto e urbanista brasileiro, figura referência da arquitetura mundial, autor, entre outros, do Plano Piloto de Brasília, projeto fundador daquela cidade.
“É uma honra e uma distinção para a CA acolher o património desta figura ímpar do modernismo”, considera o Presidente da instituição, José Manuel Dias da Fonseca, secundado pelo Diretor-executivo, Nuno Sampaio: “Esta doação reveste-se de uma enorme responsabilidade e compromisso da Casa da Arquitectura para tratar, arquivar e promover o estudo de tão notável espólio”.
Esta doação engloba cerca de 11 000 documentos simples, um conjunto documental produzido e acumulado, entre 1910 e 1998, no âmbito das atividades exercidas por Lucio Costa no domínio da arquitetura, quer como profissional liberal, quer como diretor da Divisão de Estudos e Tombamentos, do Serviço de Património Histórico e artístico Nacional (SPHAN), hoje Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).
O conjunto reflete, para além da trajetória profissional, também as vivências pessoais e familiares, compreendendo documentos de natureza diversa, como correspondência, artigos de jornais, recortes, revistas, cartazes, fotografias, álbuns de família, postais, mapas, plantas, esquissos, desenhos e apontamentos nos mais diversos suportes como envelopes, verso de calendários, folhas de rascunho ou cartões de visita, por exemplo.
Passagem de Lucio Costa por Portugal
O espólio é composto e organizado por diferentes temas, desde Referências Pessoais (família e trajetória), Projetos (de Arquitetura, Urbanismo, Paisagismo, Interiores, Roteiros de exposição e cinema), demais atividades (ensino, património histórico e artístico nacional, congressos e conferências, desenho e pintura), Obra Escrita (ensaios, artigos, depoimentos), Correspondência, Registos Fotográficos, Publicações e trabalhos académicos sobre Lucio Costa e outras publicações diversas. Há ainda um vasto leque de registos fotográficos e videográficos de índole pessoal e familiar, correspondência epistolar entre Lucio Costa e Le Corbusier e Oscar Niemeyer, incluindo desenhos originais assinados e oferecidos por Le Corbusier.
Destacam-se do conjunto documental, cinco cadernos de anotações e esboços, num total de 305 páginas, que documentam as viagens de Lucio a Portugal, em 1948 e 1952.
No que toca à Arquitetura e Urbanismo, Lucio Costa desenvolveu vários projetos de cariz público e privado, civil e religioso, nomeadamente moradias, igrejas, museus, embaixadas, hotéis, pavilhões, parques e mobiliário.
Destaca-se no espólio projetos como o Plano Piloto de Brasília, com textos e desenhos pré-concurso e os elementos depois entregues por Lucio Costa, mas também a Casa do Brasil, em Paris, o Jockey Club no Rio de Janeiro, o Museu das Missões, o Pavilhão do Brasil na Feira Mundial de Nova Iorque, entre muitos outros.
O compromisso da Casa da Arquitectura
A CA tem como compromisso a manutenção da unicidade do espólio, garantindo a conservação e a divulgação através da sua Plataforma Digital, que será lançada em breve. Toda a documentação está agora a ser tratada e digitalizada. Para efeitos de investigação e estudo, a Casa disponibiliza ainda imagens de grande resolução, promovendo a pesquisa e o desenvolvimento do conhecimento sobre a obra do arquiteto brasileiro.
A Casa fica responsável pela preservação do acervo nas melhores condições nas suas cinco áreas de Arquivo e vai fazer a gestão da política dos empréstimos de diversos elementos para múltiplas utilizações – exposições, publicações e outras formas de divulgação da obra. A Casa compromete-se ainda a manter acessíveis os suportes físicos que podem ser consultados na Casa da Arquitectura mediante marcação prévia.
A Casa da Arquitectura criou em 2019 um Centro de Estudos e Documentação para promover e incentivar a investigação dos acervos, nomeadamente, bolsas de investigação em parceria com o Estado português e também com instituições públicas e privadas, nacionais e estrangeiras.
Biografia de Lucio Costa
Lucio Marçal Ferreira Ribeiro de Lima e Costa, conhecido como Lucio Costa, nasceu em 1902, em Toulon, França, e faleceu em 1998, no Rio de Janeiro, Brasil.
Filho do almirante Joaquim Ribeiro da Costa, devido ao trabalho do pai, passou grande parte de sua infância a viajar. Estudou no Royal Grammar School, em Newcastle, Inglaterra e no Collège National, em Montreux, Suíça.
Em 1917, com os pais de volta ao Brasil, ingressa na Escola Nacional de Belas Artes – ENBA, no Rio de Janeiro, concluindo o curso de arquitetura e pintura, em 1924.
Entre os anos de 1922 e 1929, manteve um escritório de arquitetura, em sociedade com Fernando Valentim. Após a Revolução de 1930, é nomeado diretor da ENBA, por Rodrigo Melo Franco de Andrade.
Entre 1931 e 1933 associa-se a Warchavchik, para realizar projetos importantes como o Conjunto Residencial da Gamboa e a Residência Alfredo Schwartz, de 1932. Em 1935-1936, é convidado pelo ministro Gustavo Capanema a conceber o projeto da nova sede do Ministério da Educação e Saúde – MES, tarefa em que prefere trabalhar associado a um grupo de jovens arquitetos: Affonso Eduardo Reidy, Carlos Leão, Jorge Moreira, Ernani Vasconcelos e Oscar Niemeyer, com a coordenação de Le Corbusier. Esse edifício, bem como o Pavilhão do Brasil na Feira Mundial de Nova York, 1939 (projetado em parceria com Niemeyer), e o Conjunto da Pampulha, é considerado o marco inaugural da arquitetura moderna brasileira, sendo o primeiro arranha-céu no mundo a realizar integralmente os “cinco pontos da arquitetura moderna” idealizados por Le Corbusier.
Em 1937, passa a trabalhar como diretor da Divisão de Estudos e Tombamentos – DET, do Serviço do Património Histórico e Artístico Nacional – SPHAN, criado nesse ano. Deve-se a ele a definição de critérios e normas de classificação, análise e classificação do património arquitetónico brasileiro, bem como a definição de critérios para a intervenção em centros históricos. Soma-se a isso o projeto para o Museu das Missões, no interior do sítio arqueológico de São Miguel, no Rio Grande do Sul. Essa interpretação historiográfica consolida-se com os textos escritos nas décadas seguintes, como “Considerações sobre a Arte Contemporânea”, anos 1940 e “Muita Construção, alguma Arquitetura e um Milagre”, 1951. Em 1957, venceu o Concurso Nacional para o Plano-Piloto de Brasília, a nova capital do Brasil, inaugurada a 21 de abril de 1960*.
*Fonte: LUCIO Costa. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras. São Paulo: Itaú Cultural, 2018.